Friday, September 14, 2012

COM DOR NO CORAÇÃO

Texto do Rodrigo Barneschi


"Dói.

A sensação é a de enterrar parte importante da nossa história para acobertar a completa inaptidão dos dirigentes hoje à frente do clube e a vagabundagem escancarada de quase todo o grupo de jogadores. Talvez nunca consigamos entender exatamente o que ocorreu nos dois meses entre o título invicto da Copa do Brasil e a desolação de um rebaixamento que se concretiza muito antes do que seria possível supor. É fato que Scolari tem lá sua parcela de culpa, seus muitos erros e imperfeições e até mesmo doses exacerbadas de uma teimosia que só fez complicar as coisas, mas dói mesmo assim. Ou talvez por isso mesmo.

A não ser por respeito, admiração e apego sentimental, eu não teria agora como encontrar argumentos que justificassem a manutenção do treinador - uma tentativa de defesa subjetiva seria soterrada por números, decisões e fatos que não são assim tão isolados.

Mas dói. Talvez por constatar que, exceção feita a algumas poucas noites inesquecíveis no Pacaembu, em Porto Alegre, em Barueri e em Curitiba, as coisas não aconteceram como queríamos, gostaríamos e esperávamos. Nós e ele. Dói porque os números estão aí. Dói porque chegamos à situação atual juntos. Dói porque a relação se desgastou além do aceitável.

Dói porque se sacrifica um ídolo em uma vã tentativa de salvar alguns que parecem que não querem ser salvos.

Dói porque ontem, na melancólica e soturna noite que vivemos no estádio de uma das grandes noites felipônicas (21.04.1999), Scolari e Felipão se despediram amargamente do Palmeiras e de sua torcida.

Scolari deixou o campo às turras com parte da torcida em São Januário, vitimado também por seus próprios erros. Felipão, em silêncio, passou em frente aos poucos que lá estivemos e seguiu para nunca mais retornar.

Em meio ao sofrimento de ver o Palmeiras desmoronar, olhei para aquele homem pela última vez com o nosso agasalho. Ele seguiu em frente, sem olhar de volta. E sem volta também.

Dói.

Dadas as circunstâncias todas, sua saída não parece ser exatamente uma opção condenável ou execrável. Mas tende a ser inócua, pois provavelmente atrasada e por não haver margem de manobra para revolucionar um cenário desolador. Vencedores podem virar vagabundos de uma hora para a outra (como aconteceu), mas o contrário não é assim tão simples.

Com a saída de Scolari, apela-se para uma última cartada, para uma tentativa final, desesperada e possivelmente atrasada de evitar uma derrocada que tem se tornado comum na história do Palmeiras.

Com a saída de Felipão, no entanto, perdemos muito da nossa identidade. Perdemos o contato com aquele que era provavelmente o último ídolo possível nesses tempos tão modernos. Perdemos uma referência. Perdemos um escudo. Perdemos um pouco da nossa história. Perdemos muito do que somos."

Rodrigo Barneschi


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