Wednesday, June 13, 2012

Mais um texto do Bret, autor do livro "Abaixo de Zero".

"Quando eu tinha quinze anos e começava a aprender a dirigir, em Palm Springs, eu pegava o carro do meu pai enquanto ele e mamãe dormiam,e  minhas irmãs e eu andávamos pelo deserto no meio da noite, Fleetwood Mac ou Eagles tocando alto, capota abaixada, vento quente soprando, fazendo vergar as palmeiras, em silêncio. E, numa noite, minhas irmãs e eu tomamos o carro, noite sem lua e de vento forte, e alguém tinha acabado de trazer-me para casa vindo de uma festa que não fora muito divertida. O MacDonald's aonde íamos estava fechado devido à falta de energia provocada pelos ventos,e eu estava cansado e minhas irmãs brigando,e eu voltava para casa quando vi o que acreditei ser uma fogueira alguns metros adiante na estrada,e ao me aproximar vi que era uma Toyota parada de modo estranho, torta, o capô do motor aberto, labaredas brotando. O vidro da frente estavava estilhaçado e havia uma mulher mexicana sentada no acostamento, do lado da estrada, chorando. Havia também dois garotos mexicanos em pé atrás dela, fitando o fogo, os olhos esbugalhados diante das chamas recrudescentes,e eu perguntava por que razão outros carros não tinham parado para prestar socorro. Minhas irmãs deixaram de brigar e pediram para eu parar o carro, de modo que pudessem assistir ao que acontecia. Tive o impulso de fazê-lo, mas não o fiz. Diminuí a velocidade e em seguida acelerei rapidamente e empurrei de volta a fita que minhas irmãs tinham desligado quando viram as chamas e aumentei o volume, bem alto, e ultrapassei direto todos os sinais fechados até chegar em casa.

Não sei por que o fogo me perturbou, mas o fato é que o fez, e tive visões de uma criança, ainda viva, deitada sobre as chamas, ardendo. Talvez algum garoto, atirando através do vidro da frente e estirado sobre o motor, e perguntei a minhas irmãs se elas se lembravam de terem visto uma criança queimando, derretendo, em cima do motor, e disseram que não, "você viu? Que barato", e conferi os jornais no dia seguinte para me certificar de que não havia criança nenhuma no carro. E mais tarde, na noite daquele mesmo dia, sentei-me ao lado da piscina, pensando a respeito disso até que afinal adormeci, mas só depois que o fornecimento de energia foi interrompido, em virtude do vento, e a piscina ficou escura.

Lembro-me que foi naquela época que comecei a colecionar todos esses recortes de jornais; um sobre uma garota de doze anos que matara o irmão na China com um tiro acidental;outro sobre um sujeito na Índia que pregara o filho numa parede, ou numa porta, não me recordo bem, e depois o matara, atirando no rosto à queima-roupa, e um outro sobre um incêndio num asilo de velhos que matara vinte pessoas , e um sobre uma dona de casa que, ao trazer os filhos da escola de carro, despencava de um barranco trinta metros perto de San Diego, causando a sua morte e a dos três fihos, instantemente; e outro sobre um homem que, calma e resolutamente, atropelara sua ex-esposa em algum lugar perto de Reno, deixando-a paralítica do pescoço pra baixo. Colecionei vários recortes durante aquele tempo porque, imagino, havia muitos dignos de serem colecionados".

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